quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Entre a Vida e a Morte...

Desde a última postagem, um mundo de coisas aconteceu por dentro e por fora de nós...

Logo depois do evento da Laura Gutman, no dia 15 de setembro, meu pai descobriu um tumor (no pulmão, que fez metástase nos ossos e depois seguiu...).











Não, não tem nada de errado com a edição deste texto...um espaço em branco acontece dentro da gente depois dessa notícia...os sentimentos se embaralham todos: contato com a morte, com as forças e fraquezas humanas nossas e dos outros, com nossa fé (ou falta dela)...vamos tentando juntar os cacos das coisas todas: o que fizemos, o que não fizemos, o que ainda queremos fazer, as verdades e as mentiras da vida, nossas escolhas todas. Dá muita vontade de chorar, e também muita vontade de viver, de tocar em frente e de "fazer tudo direitinho pra ter um resultado legal".

Primeiro vem a negação. Meu pai ouviu o diagnóstico e assentiu com a cabeça....Nós quatro lá, juntos, ouvindo a sentença: "Aqueles pontinhos no pulmão são um tumor, vamos investigar sua natureza para decidir sobre o tratamento...Também vamos ver essas dores nos ossos, para ver se há relação...Uma psicóloga da instituição pode ajudá-los..." 








Silêncio! A gente olha pro pai, sentado na poltrona do hospital, com suas dores dilacerantes, querendo desvendar o que se passa através do seu olhar... e meu pai solta, no final da conversa: "Tratamento? Mas é um câncer?". Meu pai é o grande provedor da família toda, trabalhou a vida inteira para ver-nos com tudo que precisávamos (ou o que ele achava que precisávamos), garantidos de saúde, educação e valores. E para além disso tudo, é uma presença silenciosa e tímida, mas forte, corajosa, cheia de decisão, que mantinha o leme (moral, emocional, financeiro, estrutural) da nossa família e que sempre esteve disposto a aprender com os percalços da vida, conosco e nossas adolescências, a ultrapassar seus limites e ir em frente!

Mas porque estou escrevendo tudo isso, num blog sobre maternidade? Porque no meio disso tudo, tem o Lucano: serelepe, cheio de vida, agarrado no meu pai, perguntando sobre as coisas e vivendo-as conosco, na mesma intensidade do alto de seus dois anos de vivacidade!

Foram 5 dias de internação, um batalhão de exames e remédios para conter uma dor que só aumentava! Meu pai ansioso para sair do hospital, querendo se agarrar na vida, usando da sua racionalidade para mudar tudo o que precisava ser mudado desde o começo de tudo...Comprou uma pilha de livros e ganhou um outro (que segue hoje na minha cabeceira): "Câncer tem Cura" do Frei Romano Zago. Diligentemente, como sempre foi, passou a tomar o elixir de babosa, ligou pro Frei e, conversando com ele, reavivou sua fé. Foi na nutricionista e mudou radicalmente sua alimentação no mesmo dia, passou a comprar alimentos orgânicos e já não tinha mais vontade de cozinhar...

...Justo ele, nosso CHEF internacional, que nos proporcionou os mais saborosos almoços e jantas de toda nossa vida, que avisava sobre a proximidade da refeição com seus aromas inigualáveis pela casa, enquanto preparava-os. Que se alegrava intensamente de ouvir-nos dizer: "Que delícia!!!!!!!" E que até esperava por essa recompensa, depois das primeiras garfadas! Essa era uma de suas mais simples e verdadeiras felicidades: alimentar nossa alma, nossos sentidos, e ver nos olhos de quem provava seus banquetes, a delícia de viver seu paladar!

Se antes meditava todo final de tarde e participava de estudos espíritas, passou a meditar a maior parte do tempo: quando não era meditação formal, eu via nele uma postura (interna) meditativa...O que será que se passava no seu interior? Silêncio. Era o tempo dele, de se recompor, de se reencontrar, de decidir por ele, sem pensar nos outros...

...E o Lucano querendo que ele viesse na carona de seu carro! Mas o vovô não podia mais sentar no carrinho do Lucano, sentia dores terríveis nos quadris! Então ele sentava no sofá quando o Lucano queria o colo do vovô...Assim, o peso leve do Lucano não doía mais no osso e no coração! Significativo: A expressão "dói no osso" encaixa perfeitamente nesse quebra cabeça. O câncer dói. Dói no osso, literalmente e figurativamente. Ele dói na vida!

Seguirei contando a conta gotas, porque Lucano precisa de mim agora, e porque seguimos- eu, ele, e toda a família- elaborando juntos, no pulsar da vida do Lucano (e da nossa)!